segunda-feira, 2 de junho de 2014
CARTA
Rio de Janeiro, 02 de junho de 2014 - 04h10
Meu amor,
Mesmo que eu ache cafona começar qualquer coisa com meu amor, eis
me aqui. E sigo assumindo meu lado cafona, que acha lindo o vocativo “meu amor”.
Escrevo aqui, justificando algo que está prestes a acontecer. E embora não seja
de meu costume a justificativa, nem pretendo te mostrar esse texto, quero
intimamente que o leia, que entenda o porquê da coisa toda. O porquê que não continuar
nesse caminho.
Você é uma pessoa feliz que procura o equilíbrio, a paz
interior, e o bem estar na sua forma mais ampla, bem como a harmonia com a
natureza e os animais. Eu não. Eu sou por natura o próprio colapso de uma existência.
Um delito aos bons modos de viver e interagir com o resto. O resto que,
especialmente, não me interessa.
Nos envolvemos de uma forma tão linda e romantizada que por
si se guarda e se protege de toda e qualquer forma de condenação ou julgamento.
Me olhaste, te deixei me olhar. Te conversei em tudo. Te segui. E nos beijamos.
E o mesmo beijo apaixonado que serviu de inspiração, se apresentou no repúdio
(para alguns, carnavalescos, juro) e norteou todo resto, até este meu
entendimento.
Saiba que pra mim nunca foi fácil. E embora eu tenha 25 anos
assumo essa posição, de que a vida não foi fácil e que continuará por um tempo.
E poderia ser pior, como foi pra muita gente, e de tantas que será. Mas cada
travessia só acontece com a quantidade permitida, e sei que muitos não
carregariam. E mesmo esquecendo nos momentos de tristezas e cansaço, eu sei,
sou forte, e pior sou romantizado. Tenho o vicio boêmio da narrativa que
precisa construir as paredes e descrever os sentimentos. Ninguém é assim, né? A
não ser os loucos, lembro bem das mentiras épicas do meu tio esquizofrênico,
que tornava a monotonia do interior em autênticos roteiros de filmes policiais-
acho que é por isso que gosto da comparação da minha “espontaneidade” com a
loucura.
E a equação eu garanto aqui, você está no auge das coisas, conhece
países, pessoas e tem suas paredes reais. Eu não. Eu tenho somente o reflexo de
correr e o compromisso de não esquecer dos meus traumas, pois em algum momento
os terei que superar.
Não posso compartilhar de um sorriso seu plenamente. Ainda não sei sorrir direito, socialmente. Preciso
do álcool, preciso da música, preciso de conforto. Como feito um bicho quando
tenho fome. E reclamo quando dói. Fui educado, é claro. Mas de tudo que passei,
a sinceridade comigo mesmo é essencial, necessária para o continuar. É o doce
para não chorar. Chorar novamente. E é esse hábito que se instaurou em mim. Não
sei amar pouco, ou me sentir pouco.
Sei que sou defeituoso. E você também é. Mas sou consciente,
e não faria mal nenhum a você, que tanto gosto. Animal que apanhou não bate,
não. Defende do seu pior, pois conhece o lado mais escuro, que se foi
despertado ou aprendido. E fazer o jogo de velas para levar o barco na direção
que quero de que adiantaria, sabendo do fim ou dos perigos do caminho. Quantos
outros barcos não apodrecem no fundo das minhas águas.
Mas também não sou nenhuma tempestade completa. Meus raios
não ferem, e em noites muito escuras iluminam e desenham formas no alto, tem
sua beleza – me defendo.
Por fim vejo sua beleza, e me rendo. Nossos corpos no
encaixe e me rendo. A sintonia das peles e me rendo. Os humores irmãos e me
rendo. E me rendendo por completo, espero que você se veja mais evoluído do que
eu e me entenda. (Mas que lute, e me tome para você, eu te me dou).
Não posso caminhar sozinho ao seu lado, sozinho não. Mesmo
sendo ótimo em longas caminhadas solitárias, não poder dar o grito de help me
incomoda. E sei que outros podem tomar posse em funções que exercemos, e até
melhores do que nós mesmos.
Por tanto, meu bem, não deixemos o nosso amor para outros
amarem, não empreste nossa cama, nossa luz e toda minha poesia. Vamos nos
assistir nas manhãs, nas tardes, nas noites e em todas madrugadas. Ou esquecemos
de tudo que passou e ignoramos as possibilidades de felicidade, que entre egoísmos
e ilusões merecem todo o respeito.
5h14,
Allan Fernando
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